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Introdução

Definição

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a adolescência compreende o período entre os 10 e os 19 anos. Na população portuguesa, as primeiras relações sexuais ocorrem em média aos 16 anos. A gravidez na adolescência pode acarretar algumas implicações biopsicossociais e, em algumas circunstâncias, trazer riscos para a saúde da mãe e do feto.

Epidemiologia

A gravidez na adolescência constituiu um problema na década de 70, tendo colocado Portugal entre os países europeus com elevada taxa de gravidez na adolescência.

Actualmente a realidade é diferente, e Portugal encontra-se abaixo da média comunitária. Tem sido feito um investimento na educação sexual, contraceção e acesso aos cuidados pré-natais nesse grupo etário, resultando num decréscimo significativo do número de nascimentos de mães jovens nas últimas décadas.

A taxa de fecundidade no grupo etário dos 15 aos 19 anos tem decrescido consistentemente nos últimos anos, sendo de 7.98‰ em 2017, ou seja, 7.98 nados-vivos por cada 1000 adolescentes; em 2007, este valor era de 17‰.

De acordo com dados da Direção-Geral da Saúde, também se tem verificado uma diminuição consistente do número de interrupções de gravidez realizadas nesta faixa etária, que evoluiu de 12.2% em 2012, para 9.6% em 2017.

Causas / Factores de risco

A gravidez na adolescência existe em todos os estratos sociais, contudo parece ser mais prevalente nas jovens sem projetos de vida estabelecidos. A maioria das gravidezes na adolescência não é desejada e resulta duma multiplicidade de fatores: insucesso escolar, uso indevido dos métodos contracetivos, falta de informação aliado ao eterno pensamento tão típico da adolescência da ausência de percepção do risco.

As jovens com coitarca precoce e/ou maior número de parceiros sexuais têm maior risco de engravidar e de adquirirem uma infeção sexualmente transmissível.

É por isso importante investir na educação sexual, na informação aos jovens sobre esta matéria e na facilitação no acesso às consultas de saúde sexual e reprodutiva. Por outro lado, nalgumas culturas ou etnias a gravidez pode ser encarada como um evento desejado e normal.

História Clínica

Os sintomas iniciais de uma gravidez são inespecíficos: náuseas e vómitos, sensibilidade mamária, aumento da frequência urinária, aumento da fadiga, dor abdominal.

Perante uma amenorreia numa jovem com vida sexual e, apesar das irregularidades menstruais frequentes nesta idade, deve ser excluída a hipótese de gravidez.

O diagnóstico é feito através do doseamento da fração beta da hormona gonadotrofina coriónica, na urina ou no sangue. A confirmação de uma gravidez evolutiva é feita através de ecografia ginecológica/obstétrica.

Tratamento

Encaminhamento

Perante uma gravidez evolutiva, a grávida deve conhecer as suas opções: continuação da gestação (considerando ainda a hipótese de entregar a criança para adoção) ou interrupção voluntária da mesma.

Em Portugal qualquer mulher com mais de 16 anos pode solicitar a interrupção da gravidez (IVG) até à décima semana; se se tratar de uma menor de 16 anos, necessita do consentimento do seu representante legal. Quando a decisão passa pela interrupção da gravidez, a jovem deve pedir a consulta de IVG no centro de saúde ou hospital da área de residência.

No entanto, o diagnóstico tardio, frequente na população adolescente, seja pela desvalorização dos sinais e sintomas ou pela menor recorrência aos serviços de saúde, invalida em muitos casos a possibilidade de IVG.

Caso a gravidez evolua, as jovens deverão ser referenciadas a um centro pré-natal diferenciado, onde a abordagem será multidisciplinar.

Vigilância

As jovens adolescentes que engravidam têm maior risco de não receber cuidados pré-natais adequados, principalmente se não tiverem o apoio da família. Estas grávidas devem ser vigiadas a nível hospitalar, não necessariamente por se tratar de uma gravidez de risco, mas pela multidisciplinaridade que é oferecida e pelo incentivo à vigilância contínua e consistente.

O acompanhamento médico deve ser precoce, com a primeira consulta preferencialmente até às 10 semanas de gravidez. A frequência de consultas deve aumentar ao longo da gestação, podendo ser modificada conforme a necessidade.

Relativamente a suplementos durante a gravidez, deve ser iniciada a toma de ácido fólico e iodo o mais precocemente possível. A suplementação com ferro é iniciada geralmente no 2º trimestre, de acordo com a tendência ou o aparecimento de anemia.

O estado nutricional e a progressão ponderal devem ser avaliados ao longo da gestação. As adolescentes são particularmente vulneráveis a défices nutricionais e distúrbios alimentares, pelo que a alimentação equilibrada e o exercício físico devem ser incentivados, com atenção ao aumento insuficiente ou excessivo de peso, que podem implicar apoio da Nutrição.

Por outro lado, as jovens devem ser alertadas para os riscos do consumo de álcool, tabaco e outras drogas, frequente nesta faixa etária.

Os exames realizados durante a gravidez na adolescência não diferem das outras grávidas. Eventualmente podem ser feitas mais análises para despiste de infeções urinárias e vaginais.

O acompanhamento psicológico e social durante toda a gravidez é essencial, pelo contexto e risco de consequências socioeconómicas que estas jovens podem sofrer.

Verifica-se frequentemente um decréscimo do rendimento escolar (com risco de abandono escolar precoce, desemprego e perpetuação do ciclo de pobreza) e baixa da autoestima, isolamento da família e amigos, e um risco considerável de depressão.

Evolução

Complicações

  • Obstétricas

Estão descritas várias complicações associadas à gravidez na adolescente, nomeadamente anemia, aumento ponderal inadequado ou recém-nascidos com baixo peso, mas atualmente essa incidência parece não estar necessariamente relacionada com a idade materna, mas sim com o diagnóstico tardio e a vigilância precária e insuficiente.

Por outro lado, complicações descritas como mais prevalentes em adolescentes, nomeadamente a hipertensão induzida pela gravidez e a pré-eclâmpsia, não advêm só da idade precoce materna, mas do facto de se tratar de mulheres nulíparas.

Assim, excluindo fatores psicossociais desfavoráveis, antecedentes pessoais de risco e cuidados pré-natais inadequados, a gravidez na adolescência não é necessariamente uma condição de risco obstétrico.

São complicações comprovadamente frequentes na gravidez na adolescência:

  • Infecções urinárias

As infeções do trato urinário (ITU) são frequentes na população adolescente e são classificadas como assintomáticas (bacteriúria assintomática) e sintomáticas (cistite e pielonefrite). A ausência de sintomas típicos na gravidez pode atrasar o diagnóstico e o tratamento das cistites, aumentando o risco de evolução para pielonefrite.

Caso surjam sintomas como disúria, polaquiúria, sensação de esvaziamento incompleto ou peso pélvico deve ser feita uma análise sumária à urina seguida de urocultura. Na ausência de queixas, a periodicidade da urocultura deverá ser trimestral.

Relativamente à terapêutica, há vários agentes antimicrobianos que podem ser utilizados. Após a conclusão da terapêutica, deve ser realizada uma urocultura de controlo.

A pielonefrite aguda pode manifestar-se com febre, calafrios, náuseas, vómitos, lombalgia e queixas urinárias. Analiticamente surge leucocitose com neutrofilia, leucocitúria e bacteriúria na análise de urina. Dado o potencial risco de complicações, nomeadamente de parto pré-termo, restrição do crescimento fetal e complicações maternas como sépsis, o tratamento inicial deve ser realizado em internamento. Perante recorrências frequentes ou uma pielonefrite mais complicada, pode ser requisitada uma ecografia renal.

A profilaxia das ITU, com esquema de antibioterapia diária até ao parto, deve ser realizada após uma pielonefrite ou duas cistites não complicadas. (referência a artigo sobre infeção urinária na gravidez)

  • Infecções sexualmente transmissiveis

As adolescentes têm maior risco de adquirir infeções sexualmente transmissíveis e, se mantiverem relações sexuais durante a gravidez correm o risco de adquirir uma infeção com riscos não só maternos como fetais.  A utilização do preservativo deve ser incentivada. Sendo maioritariamente assintomáticas, a deteção destas infeções deve ser realizada em exames de rotina, ao sangue e ao corrimento vaginal.

  • Parto pré-termo

A ameaça de parto prematuro define-se como a presença de contrações uterinas acompanhadas de alterações no comprimento do colo, antes das 37 semanas de gestação.

Em Portugal, entre 2012 e 2017, verificou-se um aumento da percentagem de nados vivos prematuros (7.8% vs. 8.1%); de 2013 a 2016, a percentagem de prematuros nas adolescentes era superior ao valor nacional, mas isso já não se verificou em 2017.

Além da idade materna, são outros fatores de risco para o parto pré-termo o tabagismo, consumo de álcool ou drogas, os cuidados pré-natais tardios e o stress. Estes fatores comportamentais podem estar presentes na população adolescente, aumentando o seu risco de parto prematuro.

São sinais de alerta a presença de contrações, peso pélvico, cólicas ou alterações nas características da leucorreia vaginal, perda de líquido amniótico ou sangue.

Perante estes sinais ou, se se verificar um encurtamento do colo numa avaliação ecográfica de rotina, a grávida deve ser assistida a nível hospitalar, de forma a avaliar o risco de parto iminente e/ou instituir medidas terapêuticas.

  • Hipertensão unduzida pela gravidez

As adolescentes têm maior risco de hipertensão induzida pela gravidez. Esta surge após as 20 semanas de gestação e pode ser classificada em hipertensão gestacional ou pré-eclâmpsia, se à hipertensão estiver associada proteinúria.

Pode ser uma condição assintomática, podendo detetar-se apenas com a avaliação da tensão arterial (³140/90 mmHg em duas medições ocasionais com 6 horas de intervalo) e avaliação analítica (hemograma com plaquetas, função hepática, proteinúria).

Clinicamente pode manifestar-se com aumento súbito de peso, edemas ou sintomatologia como epigastralgias, escotomas ou cefaleias. Se a grávida não for acompanhada periodicamente, estas alterações podem não ser detetadas, podendo evoluir para quadros mais graves.

A hipertensão induzida pela gravidez necessita de medidas de monitorização e tratamento e, em casos graves, pode implicar a terminação da gravidez. São potenciais complicações a evolução para eclâmpsia (convulsões ou coma), falência de vários órgãos, restrição do crescimento fetal, descolamento da placenta ou a morte fetal in útero. (referência a artigo sobre hipertensão induzida pela gravidez)

  • Restrição do crescimento fetal

A maior incidência de recém-nascidos prematuros e de baixo peso ao nascer está relacionado com fatores biológicos (imaturidade e ganho de peso inadequado), fatores socioculturais como pobreza, estilos de vida adotados pelas adolescentes (consumo de tabaco ou drogas) e a condições médicas mais frequentes na adolescência que conferem maior risco de alterações na vascularização placentar, com consequente restrição do crescimento fetal.

A suspeita pode surgir no exame físico da grávida, com a medição da altura uterina, e a vigilância ecográfica com biometrias fetais faz o diagnóstico.

Pode implicar repouso físico, ajuste do aporte calórico por parte da grávida e investigação de condições médicas associadas. Em casos extremos, pode ser necessário terminar a gravidez.

Recomendações

Durante a vigilância pré-natal deve haver sensibilização relativamente à contraceção e à importância de evitar a recidiva da gravidez, sendo estas recomendações reforçadas no puerpério. Idealmente o tipo de contraceção deve estar definido aquando da alta hospitalar, sendo as puérperas referenciadas à consulta de Planeamento Familiar.

As contraindicações da colocação de métodos contracetivos de longa duração logo após o parto são escassas, pelo que a utilização destes métodos deve ser oferecida e incentivada, realçando a sua elevada eficácia e as vantagens em aumentar o tempo entre gestações.

Dado o risco de falha das consultas de Planeamento Familiar, pode ser importante antecipar o início do método contracetivo, nomeadamente com colocação de um dispositivo intrauterino (de cobre ou com levonorgestrel), do implante no braço (etonogestrel) ou da injeção de progestativo (medroxiprogesterona) ainda antes da alta da puérpera.

A intervenção social e psicológica é importante durante a gravidez, mas também no puerpério. As mães adolescentes devem ser devidamente referenciadas e acompanhadas, de forma a identificar riscos socioeconómicos e psicológicos, e implementar medidas protetoras da mãe e do recém-nascido.

Há um risco acrescido de depressão pós-parto nestas jovens, devendo os profissionais estar atentos a sintomas depressivos, mais frequentes nos primeiros três meses.

Por outro lado, as vidas do pai do bebé e das famílias de ambos também sofrem mudanças, podendo necessitar de acompanhamento para promover a melhor adaptação de todos a esta situação imprevista e desafiante.

Bibliografia

  1. Azevedo, W. F., Diniz, M. B., da Fonseca, E. S. V. B., de Azevedo, L. M. R., & Evangelista, C. B. (2015). Complicações da gravidez na adolescência: revisão sistemática da literatura.
  2. Instituto nacional de Estatística (INE). 2019. Estatísticas da Saúde 2017. Lisboa, 320 pp.
  3. Direção-Geral da Saúde (DGS). 2018. Saúde Infantil e Juvenil – Portugal 2018. Lisboa, 81 pp.
  4. Chacko, M. (Mar2019). “Pregnancy in adolescents”. UpToDate. www.uptodate.com

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